quinta-feira, 27 de maio de 2010

COLUNA

A MEMÓRIA PRESERVADA

É difícil dizermos quando surgiu no homem a preocupação com o passado, contudo, não acreditamos que exista, como o supõe J. Hours, algum povo que não o tenha tido. O autor de “O valor da História”, aliás, não contente em afirmar que existem povos que se satisfazem em ignorar o passado, torna ainda mais absurda a sua opinião ao dizer que estes “são mesmo os mais numerosos” e, numa clara demonstração de etnocentrismo, que por esta razão “não conseguem adquirir qualquer importância aos olhos da humanidade”.
Sua explicação para esse presumível desinteresse pela História não é menos estranha; para ele, isto seria explicado pela inexistência da instituição do Estado entre essas sociedades, o que implicaria na falta de atividades políticas e, portanto, de uma História Política.
Neste aspecto, preferimos ficar com R.G. Collingwood, que entende que “a consciência histórica é uma feição da vida tão real e universal que não conseguimos compreender que alguém não a tenha tido”.
Com efeito, desde tempos imemoriais percebemos uma preocupação do homem com o seu passado. Exemplo disso é o homem pré-histórico que, ao pintar no interior das cavernas, a par de todas as teorias e explicações acerca dessa atividade, estava, em última análise, registrando o seu cotidiano, ou melhor, a sua visão a respeito desse cotidiano. É um marco importantíssimo e significativo para a História da Humanidade: pela primeira vez o homem preocupa-se em registrar e perpetuar uma ideia.
Ainda que muitos entendam que aquilo que o homem primitivo fazia era apenas um registro artístico, o certo é que todos os povos sempre apresentaram uma lenda ou um mito explicando a sua origem e até mesmo a sua situação, quer através da oralidade, quer através de registros escritos. Esses mitos e lendas são passados de geração em geração através de uma tradição cujo valor não deve ser desprezado.
Recentemente, o historiador francês Henri Moniot demonstrou a importância dessa tradição para a reconstituição da História de uma sociedade primitiva, argumentando, em síntese, que a mesma se tornou um material da História por que é autêntica e onipresente.
A preocupação com o passado, portanto, é inerente a todas as sociedades, quer ágrafas ou não. Devemos pensar nisto, e mais ainda: não nos deixarmos levar por pessimistas quando se pretende o retorno das atividades do Museu Histórico de Caxambu, que deverá ter, segundo tivemos conhecimento, retomadas as suas obras em curto espaço de tempo, voltando a ser o fiel depositário da memória de nossa cidade.


* Historiador e atual Presidente da Academia Caxambuense de Letras.