sábado, 12 de fevereiro de 2011

COLUNA


Eis o tempo em que não adianta correr, pois as balas vão atrás de você.” Versos de Mato Seco, banda de reggae do ABC paulista, que tem feito minha cabeça ultimamente. Nunca fui fã de reggae, quem me conhece, sabe disso. As pessoas têm o péssimo hábito de julgar os outros pela aparência. Nesse contexto, quando me olham, tem absoluta certeza de que sou apaixonada pelo som jamaicano e mais ainda pela mística São Thomé das Letras. Como Já dizia o sábio e incompreendido, Nelson Rodrigues, a unanimidade é burra. Assim, tudo o que me parece senso comum, se transforma em clichê e é automaticamente riscado do meu mundo. Assim fiz por muitos anos. Até que um amigo tricordiano resolveu me ensinar a curtir reggae. Segundo ele, pr’além das letras, é preciso sentir a vibração dos acordes, deixá-los que toquem nossa alma, acalmem nosso coração e refresquem nosso pensamento. A favor de experiências novas, deixei-me levar pela batida reggae. Eis me aqui, completamente rendida e surpreendida por Mato Seco. Suas músicas me foram muito úteis no aprendizado em relação ao tempo, ao modo como ele interage conosco. Descobri que ele é fugaz e nós, mais ainda. Entretanto, nada adianta a fuga, uma vez que “não adianta correr, pois as balas vão atrás de você.”
O tempo não é nosso inimigo. Quando aprendemos como trabalhá-lo, ele pode ser um grande aliado. “Tudo nos dado, só nos falta a fé”, mais Mato Seco. Os últimos tempos me trouxeram coisas valiosas, novas e coloridas. E bem mineiras. O melhor de tudo. Dentre elas, a mais colorida e mineira de todas: Rasgacero e o Artêro. O nome soa estranho, eu sei. Mas o som feito por mais uma trupe que mescla circo à música, é transcendental. A banda é original de Poços de Caldas e faz um trabalho que vai além de música. Mistura teatro, circo e arte de rua. E ainda leva esse caldo todo pra crianças e jovens em projetos paralelos desenvolvidos pelos caras. É mais que música independente, é cidadania independente. 


O primeiro contato que tive com o Rasgacêro foi no Festival Música do Mundo, em Três Pontas. Tarde de domingo, sol no céu e brisa no rosto, a banda desceu do palco e trouxe sua magia para a terra, pro chão, pra perto de quem tava lá. A interação com o público é sinestésica. Não tem como não se levar pelo forró marcado e pitoresco desses mineiros cheios de gingado. Segundo a própria banda, a ideia do Rasgacero e o Artêro é “subverter o condicional, partindo da simplicidade criativa geradora de boas vibrações, de modo a se reinventar as sensações, reciclar os pensamentos e reaproveitar tudo de bom que se possa, tornando os seus momentos diferentes!” É uma mistura que contagia. O som vibrante do forró, com elementos circenses e teatro de rua. É o convite não só à música, mas ao show em si. São momentos em que o lúdico e o inusitado se encontram, numa dança frenética, que faz até as árvores balançarem. As letras trazem composições simples, de entendimento de si mesmo com o mundo que nos cerca. É interação, hipertextualidade, renascimento. Sobretudo, é liberdade. Liberdade das algemas das indústrias fonográficas, liberdade de composição, de criatividade, de amarras e conceitos. É música independente com a independência da arte. É um novo mundo, colorido, alegre, amoroso e livre. Como todos nós deveríamos. 

Pra encerrar, deixo um trecho de uma das músicas da banda, “Carinho que transforma”, que resume bem a sensação que trago comigo. Porque, como bem escreve Menotti Del Picchia “essa vida é um punhal com dois gumes fatais: não amar, é sofrer. Amar, é sofrer mais.”

Meu coração
Não ta agüentando mais
Essa pressão de não poder amar demais
Carinho é uma coisa boa
Que faz a pessoa poder melhorar
Especialmente hoje em dia
Só a alegria pode transformar
E eu continuo andando
E acreditando que isso vai mudar
E sempre existirá certeza
De que coisa boa sempre vai rolar