terça-feira, 2 de setembro de 2014

COLUNA


Minas dividida
                                                                               Paulo Paranhos*

Pouca gente sabe, mas no século XIX várias foram as tentativas parlamentares, tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado do Império, para se dividir a então Província das Minas Gerais. Sob as mais diversas alegações, deputados e senadores tentaram criar uma nova província, com o desmembramento de vários municípios que fariam parte da nova unidade do Império brasileiro.
Em 1842 o conselheiro Bernardo Jacinto da Veiga, externou na Câmara de Deputados a ideia de se dividir a província de Minas Gerais da qual era o então presidente pela segunda vez. Acolheram o seu projeto os deputados Francisco Otaviano, Cândido Borges, Pereira da Silva e João Antônio de Miranda, todos representantes da então província do Rio de Janeiro. Contudo, debalde os seus esforços, eis que foram fulminados na pretensão pelo então Presidente do Conselho de Ministros, o marquês do Paraná.
Em 2 de agosto de 1862 o deputado Evaristo da Veiga renovaria o projeto, só que desta vez o manifesto continha mais substância e revelava efetivamente o que se pretendia: a criação de um centro de administração no sul da província com o nome de Província das Minas do Sul. Esse projeto foi assinado por 47 deputados, dos quais 13 faziam parte da Câmara temporária e 14 do Senado, desta vez sem oposição do governo. No entanto, da mesma forma que a proposta anterior, esta também estaria fadada ao insucesso, uma vez que a Câmara de Deputados que lhe seria favorável foi dissolvida em 12 de maio de 1863.
Chegamos ao ano de 1868. O deputado Américo Lobo, representante da província de Minas Gerais, apresentou novo projeto criando a Província de Sapucaí, com a junção de municípios do sul de Minas Gerais. Da mesma forma que o projeto anterior, também não prosperou haja vista a dissolução da Câmara nesse mesmo ano.
Em 1869 uma nova tentativa foi feita, repisando-se a ideia da criação da Província das Minas do Sul, alegando-se lavoura de boa qualidade, maior quantidade de periódicos e alta renda per capta. O projeto abrangia 26 municípios contendo cerca de 535.000 habitantes. Porém, desta feita outros obstáculos se impuseram, assim como os esforços de guerra empreendidos pelo Brasil contra o Paraguai, que oneraram sobremodo os cofres públicos imperiais.
Então, em 1877, seria reapresentado este último projeto, publicado o seu teor no Diário do Rio de Janeiro de 28 de março de 1877, ocasião em que se propunha a criação de tal província a partir da união dos seguintes municípios: Aiuruoca - São José do Paraíso (atual Paraisópolis) - Jaguary (atual Camanducaia) – Caldas (atual Poços de Caldas) – Itajubá – Passos - Lavras - Carmo do Rio Claro – São Sebastião do Paraíso - Cristina – Sapucaí (atual Sapucaí-Mirim) - Cabo Verde – Alfenas - Bagagem (atual Estrela do Sul) – Araxá – Patrocínio – Sacramento – Uberaba – Prata - Monte Alegre -   Campo Grande (atual Campos Gerais) - Pouso Alegre –Baependi - Pouso Alto - Três Pontas - Boa Esperança - Campanha
Na ocasião da proposição – e este foi um dos argumentos usados pelos seus requerentes – a província de Minas Gerais tinha 78 municípios e cerca de 1.500.000 habitantes e a nova província congregaria cerca de 534.500 habitantes, de acordo com o censo de 1872. Alegavam os postulantes que a província despendia cerca de 50:000$000 para pagamento dos funcionários públicos, que deveriam abrir e conservar estradas que continuavam intransitáveis, além da realização de obras não da conveniência do povo mas de quem as contratava; excessivos gastos com a força policial para capturar criminosos que não eram presos; a instrução pública não tinha nenhum reforço e na província existiam praticamente um milhão e meio de analfabetos.
Constatamos que no período de 1824 a 1889, a província de Minas Gerais teve um total de 56 presidentes, sendo que nascidos na província o número era consideravelmente baixo: apenas 18, ou seja, 32% ocuparam o palácio do governo na cidade de Ouro Preto. Isto considerando-se, inclusive, que muitos foram reconduzidos ao cargo em anos diferentes.
No que respeita ao turismo na região, aí então a coisa ficava mais séria, pois o grande atrativo era, sem dúvida, a visita às estâncias hidrotermais localizadas em Caldas, Caxambu e Lambari, que se mostravam praticamente abandonadas, ainda que para ali fossem destinadas verbas consideráveis para a sua manutenção e exploração. Somente Caxambu, nas décadas de 1860 a 1890, possuía estrutura razoável para atendimento ao turista, haja vista que contava com mais constância de ajuda dos forasteiros e não do governo provincial. Aliás, não fossem esses abnegados que para ali acorriam em busca da cura para os males de suas saúdes, Caxambu também estaria no século XIX no mesmo nível de abandono a que estavam relegadas as estâncias de Lambari e de Caldas.         
Segundo ainda a propositura de deputados no ano de 1877, o governo provincial de Minas Gerais deveria ter a preocupação primária com as estradas e vias de comunicação numa região que era quase toda montanhosa. Muito se prometia e nada se cumpria; a estrada de ferro, uma realidade desde 1858 no Rio de Janeiro, deveria alcançar Minas Gerais em pouco tempo, mas somente em 1874 é que os trilhos da Estrada de Ferro Leopoldina chegaram a Porto Novo do Cunha e Volta Grande, avançando, depois, a E. F. D. Pedro II (depois Central do Brasil), para o centro de Minas Gerais, em 1895. No sul de Minas somente em 1881 a Estrada de Ferro Minas e Rio subiria seus trilhos em direção ao encontro da Mogiana, em Ouro Fino, e a Estrada de Ferro Sapucaí, que serviria Caxambu, apareceu em 15 de março de 1891.
Alegava-se, por fim, que muitas câmaras municipais do sul de Minas, através de propostas de seus vereadores e munícipes, queriam passar para a jurisdição da Corte e as da margem esquerda do rio Sapucaí, mormente o município de Jaraguai e de Sapucaí, conforme anteriormente mencionados, queriam passar para a jurisdição da província de São Paulo.

Somente a criação de uma nova unidade provincial no sul de Minas Gerais poderia minorar todo esse descontentamento, o que, em última instância, nunca aconteceu.