terça-feira, 25 de novembro de 2014

COLUNA


O BENGO

No dia 14 de novembro fomos, eu e minha esposa, a São João del Rey no lançamento de um novo livro da poetisa sanjoanense Maria Amélia Amaral Palladino, atual Presidente da Federação das Academias de Letras do Rio de Janeiro, nas dependências do Solar Risoleta Neves, pertencente à Universidade Federal de São João del Rey.
No caminho, o taxista que nos levou, Diego Fernandes, perguntou-se sobre o significado da palavra bengo, que dá nome ao principal ribeirão que corta a cidade de Caxambu. Então, para satisfazer aquela curiosidade, produzi o presente artigo.
Diversas são as explicações para a palavra, não para o ribeirão, evidentemente, pois desde épocas remotas passeia por tão belas paragens mineiras. Sem dúvida, a palavra é de origem africana, mais precisamente da língua kimbundu (da etnia ambundu) dos dialetos usados em Angola, de onde, aliás, veio grande leva de escravos, principalmente no século XVIII, para a região das Minas Gerais, não só para o trabalho nas minas de ouro e de diamantes, como também para as lavouras da cana-de-açúcar e depois para o trabalho nas fazendas de café.
Tal expressão – bengo – originou-se na província que leva o seu nome no noroeste de Angola, região fronteiriça ao Oceano Atlântico e que tem como capital a cidade de Caxito. Isto pode ser verificado no mapa seguinte.



Naquela região existe, também, um rio Bengo, que nasce como rio Zenza (um rio de grande volume de água) e que desagua no referido oceano, numa baía que leva o seu nome: Baía do Bengo.


No dicionário de línguas e dialetos africanos, mais especificamente com relação aos dialetos falados em Angola, podemos anotar, também, que bengo, grafado como “mbengo” ou “dibengu”, significando ambos “uma viela estreita e tortuosa”, encontrando-se, ainda, a designação para um pequeno roedor chamado “preá” (Cavia aperea).
Se pensarmos na região em que o nosso ribeirão Bengo corre, poderíamos admitir que se trata de uma passagem estreita e sinuosa, mas nada nos impede de raciocinar que ali também deveria existir uma grande quantidade desses roedores, mesmo porque estes procuram sempre locais úmidos e de vasta vegetação para sua existência e procriação.
Agora, vejamos uma outra interessante definição para o nosso ribeirão: com a vinda desses angolanos para o Brasil, incontáveis palavras foram incorporadas ao nosso vocabulário – aliás uma das maiores contribuições dada pelos africanos ao Brasil – surgindo daí, também, a denominação de um capim que se desenvolve espontaneamente em regiões de baixadas úmidas, como era, por exemplo, o nosso Parque das Águas. Esse capim tem o nome de capim-bengo, ou capim-angola, cientificamente conhecido como brachiara mutica. Ele tolera com grande intensidade o encharcamento do solo, sendo resistente a inundações e, em áreas de pasto, constitui-se no principal recurso forrageiro durante um grande período de seca.



Pois bem, meu amigo Antônio Arnaut, proprietário do Hotel Bragança, disse-me certa vez que tinha lembrança de sua infância, quando começaram a crescer os eucaliptos existentes no Parque das Águas e que ali foram plantados, muito provavelmente no início do século XX, com a finalidade de drenar o solo na ocasião das grandes enchentes provocadas, principalmente, pelo ribeirão Bengo. Ora, nada mais crível que na região também crescesse o capim-angola, ou capim-bengo, que, assim como o eucalipto, tem em sua natureza as condições próprias para o enxugamento do solo submetido a grandes inundações.
Portanto, temos três explicações para a razão de ser do nome “Bengo”, todas perfeitamente plausíveis; mas, ainda que queiramos escolher uma delas, não podemos desconhecer que se trata de um vocábulo com raízes profundas na linguagem africana de Angola.