O
BENGO
No
dia 14 de novembro fomos, eu e minha esposa, a São João del Rey no lançamento
de um novo livro da poetisa sanjoanense Maria Amélia Amaral Palladino, atual
Presidente da Federação das Academias de Letras do Rio de Janeiro, nas
dependências do Solar Risoleta Neves, pertencente à Universidade Federal de São
João del Rey.
No
caminho, o taxista que nos levou, Diego Fernandes, perguntou-se sobre o
significado da palavra bengo, que dá nome ao principal ribeirão que corta a
cidade de Caxambu. Então, para satisfazer aquela curiosidade, produzi o
presente artigo.
Diversas
são as explicações para a palavra, não para o ribeirão, evidentemente, pois
desde épocas remotas passeia por tão belas paragens mineiras. Sem dúvida, a
palavra é de origem africana, mais precisamente da língua kimbundu (da etnia
ambundu) dos dialetos usados em Angola, de onde, aliás, veio grande leva de
escravos, principalmente no século XVIII, para a região das Minas Gerais, não
só para o trabalho nas minas de ouro e de diamantes, como também para as
lavouras da cana-de-açúcar e depois para o trabalho nas fazendas de café.
Tal
expressão – bengo – originou-se na província que leva o seu nome no noroeste de
Angola, região fronteiriça ao Oceano Atlântico e que tem como capital a cidade
de Caxito. Isto pode ser verificado no mapa seguinte.
Naquela
região existe, também, um rio Bengo, que nasce como rio Zenza (um rio de grande
volume de água) e que desagua no referido oceano, numa baía que leva o seu
nome: Baía do Bengo.
No
dicionário de línguas e dialetos africanos, mais especificamente com relação
aos dialetos falados em Angola, podemos anotar, também, que bengo, grafado como
“mbengo” ou “dibengu”, significando ambos “uma viela estreita e tortuosa”,
encontrando-se, ainda, a designação para um pequeno roedor chamado “preá” (Cavia aperea).
Se
pensarmos na região em que o nosso ribeirão Bengo corre, poderíamos admitir que
se trata de uma passagem estreita e sinuosa, mas nada nos impede de raciocinar
que ali também deveria existir uma grande quantidade desses roedores, mesmo
porque estes procuram sempre locais úmidos e de vasta vegetação para sua
existência e procriação.
Agora,
vejamos uma outra interessante definição para o nosso ribeirão: com a vinda
desses angolanos para o Brasil, incontáveis palavras foram incorporadas ao
nosso vocabulário – aliás uma das maiores contribuições dada pelos africanos ao
Brasil – surgindo daí, também, a denominação de um capim que se desenvolve
espontaneamente em regiões de baixadas úmidas, como era, por exemplo, o nosso
Parque das Águas. Esse capim tem o nome de capim-bengo, ou capim-angola,
cientificamente conhecido como brachiara
mutica. Ele tolera com grande intensidade o encharcamento do solo, sendo
resistente a inundações e, em áreas de pasto, constitui-se no principal recurso
forrageiro durante um grande período de seca.
Pois
bem, meu amigo Antônio Arnaut, proprietário do Hotel Bragança, disse-me certa
vez que tinha lembrança de sua infância, quando começaram a crescer os
eucaliptos existentes no Parque das Águas e que ali foram plantados, muito
provavelmente no início do século XX, com a finalidade de drenar o solo na
ocasião das grandes enchentes provocadas, principalmente, pelo ribeirão Bengo.
Ora, nada mais crível que na região também crescesse o capim-angola, ou
capim-bengo, que, assim como o eucalipto, tem em sua natureza as condições
próprias para o enxugamento do solo submetido a grandes inundações.
Portanto,
temos três explicações para a razão de ser do nome “Bengo”, todas perfeitamente
plausíveis; mas, ainda que queiramos escolher uma delas, não podemos
desconhecer que se trata de um vocábulo com raízes profundas na linguagem
africana de Angola.