A primeira experiência
parlamentarista no Brasil
Entre
1847 e 1889 aplicou-se no Brasil o sistema parlamentar. Pela Constituição então
vigente, de 1824, a
pessoa do imperador era inviolável, sagrada e irresponsável, possuindo o
exercício do Poder Moderador, competindo-lhe
velar sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos demais
poderes políticos. Tinha,
em razão desse poder, não só a faculdade de nomear e demitir livremente os
ministros de Estado como a de dissolver a Câmara dos Deputados e convocar novas
eleições.
A
prática parlamentarista formou-se, aos poucos, nos embates da Câmara com o
Governo. A primeira demissão coletiva do Ministério teve lugar em 1838, sob a
liderança de Bernardo de Vasconcelos. Em 1843, porém, a praxe da solidariedade
passou a ter lugar. Ao demitir-se Aureliano de Souza, ministro dos Negócios
Estrangeiros, em face de uma censura implícita da Câmara, solidarizou-se e
demitiu-se todo o Gabinete.
Sem
dúvida, muito influiu a argúcia de D. Pedro II para modelar o sistema nascente.
Convencido de que o Ministério deveria ter a confiança da Câmara, encarregou o senador
Honório Hermeto Carneiro Leão de organizar um novo gabinete. Estava, assim,
praticamente criado o cargo de Presidente do Conselho de Ministros. Pouco depois,
por decreto de 20 de julho de 1847, criava D. Pedro II legalmente o cargo,
consagrando-se, assim, ostensivamente, o Governo de Gabinete no Brasil.
Apesar
de ter D. Pedro II aceitado as restrições de formar o Ministério, o imperador
nunca abdicou de suas prerrogativas asseguradas pela Constituição, substituindo
muitas vezes os ministros sem o beneplácito do Parlamento. Por isso, é comum
ouvir-se dizer que, no Brasil, o imperador não só imperava como governava e
administrava. O imperador, como delegado privativo do Poder Moderador,
desempenhava um papel político extraordinariamente importante.
Mesmo na esfera
administrativa, o próprio Conselho de Estado nada resolvia sem que o governo
lhe aprovasse os pareceres ou lhe resolvesse os problemas. D. Pedro II jamais
deixou, ao mesmo tempo, por isso mesmo, de reinar e governar. E não só
governava através de seus ministros responsáveis, como por si mesmo.
Dos
35 Ministérios formados durante o seu reinado, oito caíram por voto de censura
ou moção de desconfiança, explícita ou implícita, e cinco por demissão
espontânea, em face da atitude da Câmara. Os restantes, porém, caíram por meras
desinteligências com o imperador, que não deixava de imiscuir-se na
administração.
Em
contraposição, porém, D. Pedro II decretou a dissolução da Câmara 11 vezes. Em
obediência aos reclamos da opinião pública, por exemplo, prestigiou muitas
vezes Gabinetes como os do Visconde do Rio-Branco e de José Antônio Saraiva,
responsáveis por leis de grande repercussão nacional. O primeiro, pela Lei do
Ventre Livre, de 1871, e o segundo, pela Lei Saraiva-Cotegipe, de 1881,
implantando também importante reforma eleitoral no Império.
Contudo,
com Pedro II no exercício do Poder Moderador, não podemos deixar de reconhecer
ter sido o Império, sob o parlamentarismo, a idade de ouro nacional, como o chamou Heitor Moniz, um dos
nossos mais credenciados jurisconsultos.
A
vida do sistema parlamentar brasileiro foi fruto exclusivo da ação pessoal de
D. Pedro II, graças a quem, exclusivamente, pode funcionar. Não devemos nos
esquecer, porém, que o Governo parlamentar monárquico viveu uma era de intensa
agitação política, partilhada pelas lutas regenciais, da abolição do tráfico e
da libertação dos escravos, pelas questões platinas e pelos problemas da Guerra
do Paraguai. E, apesar de tudo, não sofreu solução de continuidade a luta,
nessa época, contra a irresponsabilidade do poder pessoal, que jamais
esmoreceu.