terça-feira, 1 de setembro de 2015

COLUNA



D. Marcos Barbosa: um grande orador sacro

A cidade de Cristina comemorará, no próximo dia 12 de setembro, o centenário de nascimento de Lauro de Araújo Barbosa, que viria a ser um dos grandes oradores sacros do Brasil. Dono de uma invejável oratória, tornou-se padre aos 31 anos, ingressando no Mosteiro de São Bento, na cidade do Rio de Janeiro. Ali seria conhecido como D. Marcos Barbosa.
No ano de 1934, concluiu o curso superior em Direito pela Faculdade Nacional de Direito, hoje integrante da UFRJ. Durante sua vida universitária participara ativamente do Centro Dom Vital e da Ação Católica Universitária. Foi exatamente pela sua vivência no Centro Dom Vital que travou conhecimento com Alceu Amoroso Lima, de quem se tornou secretário particular. Alceu, mais conhecido por seu pseudônimo de Tristão de Athaíde, foi um dos maiores pensadores católicos do século XX.
Na mesma época, entrou em contato com o Mosteiro de São Bento, onde ingressou com outros universitários em 1940, interrompendo os estudos do curso de Letras Clássicas, iniciado que fora logo após a conclusão do curso de Direito. No mosteiro, onde foi ordenado sacerdote em 1946, retomou a vocação de escritor, pois já publicara antes crônicas e poemas não só em A Ordem e Vida, revistas de que foi redator, como ainda em O Jornal e na Revista do Brasil.
Ingressaria na Rádio Jornal do Brasil onde, entre 1959 e 1993, conduziu o programa Encontro Marcado, que ia ao ar diariamente às 18 horas. Em seguida, esse programa passou a ser transmitido pelas rádios Carioca-AM e Catedral-FM, também diariamente. Colaborava, também, no Jornal do Brasil às quintas-feiras.
 D. Marcos inovou a oratória sacra, pelo estilo poético dos seus sermões. Obteve os dois primeiros lugares no concurso para a letra do hino do XXXVI Congresso Eucarístico Internacional realizado no Rio de Janeiro em 1955, como também fez parte da equipe de tradutores de textos litúrgicos da Conferência Nacional dos Bispos – CNBB.
Traduziu além de obras de Paul Claudel e François Mauriac, três livros que se tornaram famosos: O pequeno príncipe, O menino do dedo verde e Marcelino Pão e Vinho. Integrou por vários anos o Conselho Federal de Cultura e foi escolhido para saudar em nome dos intelectuais o Papa João Paulo II em sua primeira viagem ao Brasil.
Como intelectual que era foi eleito para a cadeira 15, de Olavo Bilac, da Academia Brasileira de Letras, na sucessão de Odilo Costa Filho, sendo recebido em 23 de maio de 1980 pelo acadêmico Alceu Amoroso Lima. Além disso, sucedeu a Otávio de Faria no Pen Clube, em 15 de outubro de 1981, tendo sido saudado por Antônio Carlos Villaça. Também ocupou na Academia Brasileira de Artes a vaga de Alceu Amoroso Lima, tendo sido recebido por Marcos Almir Madeira em 12 de setembro de 1985. Cidadão honorário do município do Rio de Janeiro (1984), recebeu o Prêmio de Poesia do Pen Clube do Brasil, em 1986; agraciado, em 7 de junho de 1990, com a condecoração de Chévalier des Arts et des Lettres, concedida pela República Francesa. Autor de uma vasta obra literária, destacando-se aqui algumas delas:
A noite será como o dia: autos de Natal, 1959
Poemas do reino de Deus, 1961
Eis que vem o Senhor,
1967
O livro de Tobias, 1968
Oratório e vitral de São Cristóvão, 1969
Manifestações de autonomia literária: a Escola Mineira e outros movimentos.
A arte sacra,
1976
Nossos amigos, os santos,
1985
Um encontro com Deus: Teologia para leigos, 1991
As vinte e seis andorinhas, 1991
Poemas para crianças e alguns adultos, 1994




Vejamos a beleza de uma de suas poesias inserida na obra O livro da família cristã, do ano de 1960:
         
Oração da família

Bem debaixo, Senhor, da tua asa, coloca a nossa casa.
Nossa mesa abençoa, e o leito, e o linho, guarda o nosso caminho.
Brote, em torno, o jardim, frutos e flores, em nossa boca, louvores.
Conserva pura a fonte de cristal, longe o pecado e o mal.
Repele o incêndio, a peste, a inundação, reine a paz e a união.
Bem haja na janela o azul do dia, na parede, Maria.
Encontre a noite quieta a luz acesa, quente sopa na mesa.
Batam à porta o pobre e o viajor, e tu mesmo, Senhor.
Tranquilo seja o sono sob a cruz que a outro sol conduz.

Tive o privilégio de conhecer D. Marcos Barbosa, na década de 1970, quando fazia o curso de Museologia, e em algumas aulas de História da Arte frequentávamos o Mosteiro de São Bento, um dos raros templos de concepção maneirista na cidade do Rio de Janeiro. Ali, em conversas com ele – já era seu fã do Encontro Marcado – pude aquilatar a grandiosidade de sua inteligência, o conhecimento que possuía da cultura brasileira e, principalmente, da convicta fé cristã. Lembrou de seus tempos de infância em Cristina e em Maria da Fé quando escrevia, dirigia e atuava nas peças teatrais nas escolas da cidade.
Dom Marcos Barbosa faleceu na cidade do Rio de Janeiro, vitimado por uma insuficiência renal, no dia 5 de março de 1997, ocasião em que foi, dada a significância do seu nome, decretado na cidade luto oficial por 3 dias, deixando uma lacuna não só na Casa de Machado de Assis como também, com sua incontestável sabedoria, nas letras litúrgicas brasileiras.