POR DETRÁS DAQUELAS MONTANHAS
O que se discorre neste artigo é um preito de gratidão a uma cidade que nos acolheu, a mim e à Lourdes, durante 20 anos de nossas vidas, cidade que elegemos para viver e encerrar os nossos dias terrenos. Infelizmente, circunstâncias as mais diversas – e uma delas foi exatamente a constatação do crime que se cometia contra a natureza através da edificação desenfreada de prédios e a derrubada da mata nativa para a construção de condomínios - fizeram com que dela nos apartássemos, porém nunca deixando de amá-la, de querer-lhe bem e, sobretudo, de bendizer a sua geografia – uma das mais belas do mundo!
Em 2006 fui agraciado com o título de “Cidadão Teresopolitano”, láurea que muito me honrou, pois considero ser a honraria a que todos os que ali não nasceram almejam. Anteriormente, em 1996, já havia recebido o troféu “Mulher de Pedra”, do Comitê de Imprensa de Teresópolis, pela passagem como Presidente da Academia Teresopolitana de Letras. O fato de receber as duas mais significativas comendas da cidade, fez-me uma pessoa extremamente agradecida não só à própria cidade, como à sua gente, sempre tão hospitaleira.
Agora, vendo a tragédia que se abateu sobre a cidade, fico pensando no tempo em que ali vivi e presenciei a descaracterização daquela que um dia foi considerada a “joia da Serra dos Órgãos”: desmatamento indiscriminado, falta de planejamento no uso do solo urbano, com concentração elevada e perigosa na região periférica da cidade, colocando em risco as nascentes e a mata ciliar do rio Paquequer (aquele mesmo do romance “O Guarani”, de José de Alencar). Aliás, tudo isto está muito bem embasado nos registros do IBGE: a cidade cresceu vertiginosamente sem planificação séria para suportar a quantidade de pessoas que para ali se deslocaram, principalmente da Baixada Fluminense.
Agora, o que presenciamos é, conforme já foi dito à larga nos meios de comunicação, a chamada “morte anunciada”, pois não é de hoje que a cidade vem agonizando e seu meio ambiente pedindo socorro.
Agora, a maior tragédia ambiental de todos os tempos, numa madrugada chuvosa de 12 de janeiro.
“Teresópolis, terra de luz e de amor”, conforme diz a primeira estrofe do hino da cidade, uma obra-prima do jornalista Renato Ferro, sempre foi detentora de uma beleza natural deveras marcante para todos aqueles que a visitavam, correndo um sério risco de se apaixonar à primeira vista. Isto aconteceu com aqueles que para lá foram, da mesma forma que aconteceu comigo, pensando em viver numa cidade onde a paixão desenfreada pelo verde, pela claridade de seus dias, pelo frescor do ar e pelas noites faiscantes de estrelas que beijam o céu azul, seria uma constante em minha vida.
Nascida de uma simples freguesia, a de Santo Antônio do Paquequer, em 1855, Teresópolis assumiria foros de município em 1891, mais precisamente no dia 6 de julho. Floresceu bela e atraiu a curiosidade de todos aqueles que a circundavam. De que era feita a sua beleza, qual o seu mistério? E, de simples vila, transformou-se, com o tempo, na majestosa rainha da Serra dos Órgãos. Tão cativante era que aguçou as ideias do governo estadual em transferir para suas terras a sede da administração pública fluminense, logo em 1893, porém sem a efetiva realização.
Tão deslumbrante era que sua paisagem deveria ser partilhada com todos, indiferentemente de credo ou raça. E então chegaram os trilhos da E. F. Teresópolis. A maria-fumaça com cremalheira, a subida da serra, os abismos. Tudo uma sensação de imensidão, tudo uma verdadeira aventura. A beleza estonteante do verde, o azul da baía de Guanabara ao longe. Acima, como disse o poeta, a “impressão digital de Deus” (foto), quase a 1200 metros do nível do mar, confirmando uma verdade inconteste: quando descansou ao sétimo dia, Deus o fez em Teresópolis!
Agora, a destruição, a dor, o sofrimento de todos que aprenderam a amar aquele pedaço da Serra dos Órgãos, a revolta pela falta do bom senso no planejamento urbano. Uma dor difícil de ser mitigada, de ser apagada das nossas mentes.
Agora, estamos a exatos 335 km de Teresópolis, mas nosso pensamento e nossa esperança não encontram barreiras geográficas para rogar a Deus que dê forças àquela gente, para que se reconstrua rapidamente uma das mais belas cidades do Brasil.