terça-feira, 7 de julho de 2015

COLUNA


Sobre o Parlamentarismo

Avivadas pela discussão que se estabeleceu na Câmara de Deputados nesta última semana, onde a redução da maioridade penal apareceu em primeiro plano, outras matérias mereceram uma rejuvenescida (?) discussão a partir do momento em que a Casa Legislativa vê sua identidade autônoma contestada por integrantes do Executivo federal e, nessa esteira, volta a antiga ideia da mudança do sistema de governo – de presidencialismo para parlamentarismo – como se isto fosse uma panaceia para, senão eliminar, pelo menos atenuar ações desavergonhadas que fazem com que o governo seja manchete diária nas páginas criminais.
Assim, dou início a uma série de artigos sobre a instituição do Parlamentarismo pretendendo, muito mais do que ensinar, avivar uma discussão que, a meu ver, não vai levar a nada, a não ser, mais uma vez, lançar uma bomba de fumaça à Nação como um derivativo enganador para acobertar outras e tantas falcatruas que se cometem contra este indefeso país.
De acordo com os ensinamentos de um dos principais constitucionalistas brasileiros, o Prof. Sahid Maluf, o Parlamentarismo teve a sua origem na Inglaterra, de onde se transplantou para a França, a partir de 1814, passando para a Bélgica, Alemanha, Polônia, Checoslováquia, Áustria, Grécia, Iugoslávia, Finlândia, Espanha e demais países. Em cada um deles sofreu modificações mais ou menos substanciais, determinadas pelos imperativos das realidades políticas nacionais.
Baseia-se o Parlamentarismo, fundamentalmente, sobre a igualdade de prestígio dos dois poderes do Estado, o Executivo e o Legislativo. Governo e Parlamento passam a exercer, um sobre o outro, limitações recíprocas. Essas limitações são conseguidas através da peça política por excelência do regime, que é o Conselho dos Ministros (Ministério ou Gabinete). Sobre essa figura institucional, o historiador inglês sir Ivor Jennings nos ensinou que o Gabinete é o centro do sistema constitucional. É a suprema autoridade diretora. Integra o que de outro modo seria uma coleção heterogênea de autoridades exercendo uma vasta variedade de funções. No Gabinete, e ainda mais, fora dele, a pessoa mais importante é o Primeiro-Ministro.
Para que o regime funcione dentro de suas características importante é que o Parlamento não ocupe situação inferior à do chefe do Estado. Nesse caso, rompendo-se o equilíbrio dos dois poderes, iríamos em direção a uma ditadura e não se justificaria o nome geral dado ao regime: Parlamentarismo. No sistema parlamentar, toda a soberania está representada no Poder Legislativo, ao qual se subordinam todos os outros poderes.
Apesar de o sistema parlamentar ser, antes de tudo, para muitos, um sistema de separação de poderes, com o Executivo e o Judiciário independentes do Legislativo, não há uma divisão estanque de poderes. Alguns autores não negam a separação dos poderes no regime parlamentar, mas não há dúvida de que nessa separação reconhecem eles perfeita acumulação de funções políticas.
O Parlamento tem funções legislativas, propondo, às vezes, a lei, discutindo-a sempre e votando-a; tem funções executivas, votando medidas não-legislativas e sobretudo o orçamento anual do país onde, ao lado do estabelecimento de novos impostos e da manutenção dos antigos, de cunho legislativo, incluem-se disposições de toda ordem, que fixam o montante das despesas públicas e reservam créditos para os diversos serviços.

E o que cabe ao Executivo? A principal de suas atribuições é a de convocar os eleitores para proceder à eleição da parte eletiva do Parlamento, a de convocar, adiar, prorrogar e encerrar as sessões parlamentares e, sobretudo, a de dissolver a parte eletiva do Parlamento e convocar os eleitores para novas eleições.

Essa última atribuição é, por excelência, o freio mais seguro da soberania nacional contra os excessos porventura praticados pelo Parlamento. Se o Governo chega à conclusão de que a política seguida pelo Parlamento não corresponde à vontade da nação, cabe-lhe a faculdade de dissolvê-lo e de provocar, com isso, um autêntico referendum. Tal prerrogativa encontra um similar na faculdade que apresenta o Parlamento de exercer constante e geral controle sobre os atos do Governo e de poder responsabilizar solidária e politicamente os ministros.
Assim, pode-se, em termos gerais, definir o Parlamentarismo como o regime político em que o chefe do Estado escolhe ministros que, constituídos em Conselho ou Gabinete, são solidária e politicamente responsáveis perante o Parlamento. Por tal definição, pode-se depreender facilmente que a característica principal do regime é a responsabilidade política e solidária do Gabinete em que se apoia. Através dessa responsabilidade o Parlamento exerce indiretamente controle contínuo sobre toda atividade governante.
Os ministros, como integrantes do Poder Executivo são, nesse regime, responsáveis perante o Parlamento, que, por sua vez, é responsável perante o eleitorado. Tal responsabilidade, de fundo moral, pode acarretar a perda do poder. É, aliás, o que entende o já citado professor Sahid Maluf: o povo, por si ou por sua representação, enquanto fiel e legítima, exerce como que um policiamento preventivo em face do governo, o que substitui, com indiscutíveis vantagens, as medidas repressivas a posteriori, sempre falhas e destituídas de real interesse público.
O mesmo não acontece, por exemplo, no regime presidencialista, onde a responsabilidade toma aspecto meramente criminal, através do instituto do impeachment.